Este mês a Preguiça Magazine senta "Na Espreguiçadeira" Maria do Rosário Pedreira, escritora e 'caça-talentos da edição.
1. O
que estás a ler neste momento? Recomendas ou nem por isso?
Terminei agora mesmo um romance que queria ler há muito tempo, mas ainda não
tinha conseguido tempo para ele, A Breve e Assombrosa Vida de Oscar Wao, de
Junot Díaz, Prémio Pulizer: um verdadeiro pontapé no estômago e o livro que
tem, seguramente, a palavra “rata” escrita mais vezes em toda a literatura
contemporânea. Uma obra contundente, impiedosa e absolutamente magnífica. Não
só ficamos a conhecer a história da República Dominicana para além dos postais
de Punta Cana e os seus horrores ditatoriais no século XX, mas também uma
família absolutamente notável, de que Oscar Wao é apenas um dos membros. Nunca
vou esquecer esta obra-prima que, evidentemente, recomendo a todos os que
tenham bons estômagos e gostem de um romance a sério.
2. O
que mais facilmente te leva a pegar num livro: a capa, o título, o autor, os
amigos ou os desconhecidos?
Normalmente, quando compro livros, já sei ao que vou, a capa é um mero
embrulho, o título nunca é decisivo (há tantos livros maus com bons títulos e
vice-versa; e, quanto às capas, agora é tudo uma massa indistinta de “papel
pintado”, como diz Pacheco Pereira). O autor é, geralmente, aquilo que me move,
mas também pode acontecer alguém em quem tenha confiança aconselhar-me um livro
que não conheço, embora seja menos frequente (aconteceu-me, por exemplo, com Casa
de Campo, de José Donoso, há muitos anos). Também tenho curiosidade pelos
jovens autores portugueses que os críticos elogiam, porque é fundamental, na minha
profissão, estar atenta à concorrência. Por fim, posso pegar num determinado
livro por causa da editora que o publica. Tenho absoluta confiança em alguns
colegas e algumas chancelas, sei que o que dão à estampa é de qualidade; mesmo
que isso não queira necessariamente dizer que vou gostar, parto para a leitura
com um certo optimismo.
[...]
4. Se
houvesse um incêndio na casa do teu vizinho, que livro aproveitavas para atirar
para a confusão?
Talvez uma coisa (nem lhe chamo livro, porque não merece) chamada Vai
Aonde Te Leva o Coração, de Susanna Tamaro, que tive de ler há
muitos, muitos anos para fazer uma recensão num boletim que então editava. Era
de vómitos. Ainda por cima, manipulador, tratando o leitor como um ignorante
que acredita em tudo o que lê e vai na conversa que lhe impingem. Chantagista
também. Em todo o caso, isso de queimar livros lembra histórias horríveis que
todos conhecemos. Mesmo sendo este livro pequeno e fazendo uma fogueirinha de
nada, parece-me que não o mandaria ao lume. Para quê aumentar o fogo do
vizinho?
5. O bichinho dos livros passa de pais para filhos?
Creio obviamente ser importante crescer numa casa com livros e ver os pais a
ler desde que nascemos. Nem que seja por imitação, o gesto de começar a folhear
pode desencadear o amor aos livros. Mas não há, infelizmente, receitas. Há pais
leitores com filhos que não lêem, e há pais analfabetos com filhos que adoram
ler. O que é preciso é o acesso ao livro para todos, se não for em casa, que
seja na escola. Mesmo assim, a paixão pela leitura só acontecerá se entre
leitor e livro houver de repente um clique que muda tudo. E há jovens que nunca
conseguem sentir esse clique. Os pais podem ser importantes na variedade de
livros que colocam à disposição dos filhos, explicando-lhes que, mesmo não
gostando de um, poderão gostar de outro. Mas não nos iludamos: haverá sempre
pessoas que não vão querer ler.
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